Imagem: Lichtenstein
Antonio
Silva
Eles se amavam. De fato a ansiedade, a tensão, o
coração acelerado, a falta de palavras e gestos quando seus olhos se cruzavam.
Dava para garantir que aqueles dois seres se amavam.
Mas, engana-se que o amor é o melhor dos sentimentos,
pode sim ser um dos piores. Eles se amavam, mas não podiam ficar juntos, não
poderiam nem pensar em querer desfrutar de todo o furor que esse amor poderia
trazer para eles. Eles sabiam disso, e talvez isso fizesse eles se amarem ainda
mais.
A sociedade jamais aceitaria seu amor. Justo eles
seres sociais perfeitos de vida pacata, que viviam do jeito que Deus
determinou, mas também do jeito que o Diabo gosta.
Cada um teria que enfrentar sua própria guerra para
ficarem juntos. Teriam que magoar muitas pessoas, perder muitos daqueles que
faziam parte de sua vida, tudo em nome do amor.
Amor insano que poderia fazer com eles algo
inimaginável. Eles se desejavam, e se provocavam. Isso fazia crescer aquele
amor proibido que nem era tão proibido assim, bastava ter coragem.
E eles tiveram coragem. Criaram códigos, senhas,
diálogos próprios para viver aquele amor. Aprenderam a se amar a distância
quando juntos apenas sorrisos e cumprimentos normais, mas seus olhos se amavam
como nunca ninguém amou antes.
Dois poetas que fizeram da poesia seu meio de
comunicação, trocavam versos, palavras que a leitura alheia parecia sem lógica,
mas no universo do amor deles era tudo o que precisavam um do outro era tudo o
que podiam dar um para o outro.
Eles se amavam com palavras. Escrevia no vento que
cortava seu caminho, que balançava seus cabelos. Recebia suas palavras e
devolvia beijos pelo ar. Bastava o gesto e os lábios se tocavam. Contaram seu
segredo ao tempo que assistia as cenas todos os dias.
Escrevia nas folhas das árvores para
que o vento soprasse até seu caminho. Em cada folha um pouco de seu amor.
Viviam na expectativa da repetição dia após dia repetiam incansavelmente o
mesmo ritual. O amor também é a arte de se repetir.
Do alto de sua janela de vidro a
esperava passar, um sorriso, um aceno e um beijo ao vento. Ali começavam seus
dias, ali sobrevivia o romantismo, ali sobrevivia o mais puro amor.
Nunca quiseram mudar isso, poderiam
sim largar toda a vida regrada e socialmente correta que construíram, mas seria
a condenação moral dos dois, teriam que mudar de cidade, talvez de estado ou
até de país para viver aquela paz do sentimento. Seus olhos guardavam o
segredo, guardavam as sensações do corpo, guardavam o desejo que ardia na pele.
Seus olhos eram os cúmplices daquele amor insano. Mas, amores assim mudariam o
mundo se o mundo estivesse preparado.
Sei que eles eram felizes assim. Não
estavam fisicamente juntos, mas espiritualmente sim, e se não podiam se tocar,
se beijar, sair juntos. Viviam na plenitude do pensamento. E isso preservava
apenas o melhor de cada um para o outro.
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