sexta-feira, 31 de outubro de 2014

CRÔNICA DE UMA MORTE ANUNCIADA




Antonio Silva

            A vida é uma sucessão de fatos, entre idas e vindas às cenas são sempre as mesmas, dizia o filósofo. Ele nunca acreditou nisso, mas naquele momento começava a repensar, ou melhor, a pensar no que acreditava ou não.
            Ele que sempre via aquilo pela TV jamais pensou que poderia acontecer com ele. Tudo bem que a cidade era violenta, mas ele sempre tomava cuidado até que aquilo aconteceu.
            Estava no banco tranquilo, já se dirigia a porta quando de repente sentiu uma forte puxada pelas costas e antes mesmo de raciocinar sobre o que poderia ser aquilo sentiu aquele cano gelado na cabeça e uma voz no seu ouvido dizia – você é meu refém não tente reagir senão.. –
            Nem se quisesse reagir não conseguiria, estava em choque, não se mexia, estava completamente travado. Aos poucos foi recuperando os sentidos, aos poucos começava a perceber o mundo ao seu redor, começava a acreditar no que dizia o filósofo a noticia de ontem se repetia hoje, mas hoje era com ele.
            Em silêncio começou a pensar na própria vida, nas coisas que queria fazer, mas, sobretudo nas coisas que deixou de fazer, olhando fixo para a parede viu passar o filme da sua vida, filme sem grandes emoções, sem grandes aventuras, com muitas perdas e fracassos, mas era sua vida e precisava permanecer assim imóvel para conserva-la.
            Suava frio, seus músculos doíam de tensão, seus olhos estavam esbugalhados. Por instantes quase desmaiou parecia que estava saindo do próprio corpo, ao voltar a si criou coragem e começou a questionar o assaltante que o mantinha refém.
            Ofereceu dinheiro, ajuda para ele mudar de vida, mas ele não aceitava, dizia que essa vida não tinha volta que precisava fazer aquilo para provar que podia, mas provar para quem? Provar o que? O diálogo de murmúrios só foi interrompido com os gritos de ameaça aos policiais que tentavam negociar com ele, não havia negociação, ele precisava se auto provar.
            Ele vendo que não teria saída resolveu se calar não conversaria mais com aquele que o colocava na situação mais atormentante de sua vida e ainda com uma arma na cabeça, não haveria conversa, não haveria negociação ele apenas torcia para que a polícia percebesse isso logo, invadisse o banco matasse o bandido e o livra-se daquilo logo.
            Quando isso acontecesse ele iria pedir demissão do emprego, iria se declarar para a vizinha que amava desde criança, iria comprar uma moto e viajar o mundo, dar mais emoção ao filme da sua vida.
 Já se sentia mais relaxado quando percebeu que a discussão entre o assaltante e a policia ficou mais intensa, entre meio as vozes exaltadas ele ouviu – vou matar ele – Então fechou os olhos sentiu o estalo do gatilho, parecia ouvir a bala vindo em direção a sua cabeça, sentia o calor dos lábios da morte, sentiu o beijo fatal que esfacelou seu crânio Bang!!! Era o fim para ele.
Era o fim também para o assaltante que foi morto pela policia em seguida, mas dentro de sua lógica morreu como herói, pois conseguiu se auto provar.

PUBLICADO NO JORNAL FOLHA DE NOVA HARTZ 
SEMANAL ANO X EDIÇÃO N° 354
SEXTA-FEIRA 31 DE OUTUBRO DE 2014

Nenhum comentário:

Postar um comentário