sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

A CAMISA AZUL DA SORTE

Fraga

                                                                                                                            Antonio Silva
 


            O time do Murilo não tinha uniforme para jogar, jogavam sem camisa ou com uma da mesma cor, sem número sem nada. Mas, Murilo queria resolver esse problema reuniu os amigos e juntaram as economias para comprar um tecido azul e um branco para fazer um fardamento.

            Feito isso, entregaram os tecidos para a mãe do Marquinhos que era costureira fazer os uniformes. Os números eles mesmos pintaram com uma tinta amarela que compraram com o dinheiro que havia sobrado dos tecidos.

            O problema dos uniformes estava resolvido, mas um maior ainda assombrava Murilo e seus amigos. Precisavam vencer a turma da rua de cima. Não venciam há muito tempo, e a zoação era forte, já circulava pelo bairro que o time de Murilo passaria a se chamar o “Time que nunca venceu.”

            Quando o time da rua de cima soube que Murilo e seus amigos tinham conseguido uniformes. Imediatamente Marcão o capitão da rua de cima chamou os companheiros de time e mandou desafiar Murilo para um jogo no final de semana.

            Aquela noticia estremeceu Murilo e o resto do time. No sábado teriam que estrear o uniforme novo ou além de não vencer seriam chamados de cagões, mas não aceitar o desafio era confirmar que eram cagões. Murilo então respondeu que aceitavam o desafio.

            Treinaram um pouco durante a semana, pois sabiam que tinham um grande desafio pela frente, vencer o time de Marcão era algo raro nos últimos anos e estrear o novo uniforme com o máximo de dignidade possível.

            O time do Marcão não treinava. Os garotos eram uns monstros comparados aos meninos das outras ruas, Marcão era o mais temido, um negrão forte devia ter uns 20 anos, os fios de bigode denunciavam, mas ninguém nem mesmo os companheiros ousavam perguntar.

            Marcão era zagueiro e capitão da rua de cima. Murilo era atacante e capitão da rua de baixo. A diferença física era enorme, Murilo tinha apenas 13 anos e era magrelo, e Marcão como eu disse era fortão e beirava os 20 anos. O encontro entre eles era inevitável.

            No sábado o sol saiu logo cedo e brilhava ansioso pelo confronto. Duas da tarde chegavam no campinho Marcão e sua galera vestindo um fardamento todo preto se não fossem jogar bola poderiam muito bem ir a um velório. Logo depois chegou Murilo e seu time, vestiam uma camisa azul com números amarelos, calção e meias brancas.

            Antes de começar o jogo Marcão riu e disse: - Belo pano, vou secar seu sangue com ele se fosse se engraçar. – Começado o jogo o time do Marcão partiu para cima e parecia que novamente ia massacrar o time de Murilo, que era salvo graças aos milagres de goleiro Luís.

            Mas, em uma escapada Carequinha lançou para Murilo que saiu livre nas costas de Marcão e colocou na saída do goleiro. 1x0. A tensão aumentou, o time do Murilo dominava depois do gol, quando Marcão chegou no ouvido de Murilo e disse: - Mais uma vez que passar por mim quebro sua perna. –

            Novamente Carequinha escapou e lançou para Murilo que dominou e sem querer deu um chapéu em Marcão deixando-o sentado na grama. Quando percebeu o que tinha feito apenas pensou “Ai minha perna,” mas, já que teria a perna quebrada mesmo chutou forte no canto esquerdo 2x0.

            No fim Marcão nem quebrou sua perna, mas prometeu: - No campeonato do bairro pego você. – Depois do jogo era só festa, foi aí que Carequinha o maestro do time disse: - Não devemos lavar as camisas, pois senão perderemos nossa  sorte.  – Na dúvida todos concordaram.

            Voltaram apenas a vestir o uniforme um mês depois quando começou o campeonato do bairro. O cheiro de suor era encarado como uma questão de sorte e para vencer tudo valia. E se suor realmente fosse sorte naquele dezembro escaldante isso não faltaria.

            Era sorte ou mau cheiro, mas, o time do Murilo estava vencendo todas as partidas, tinha a melhor defesa e o melhor ataque. Seguiam por dez rodadas sem lavar as camisas e se vencessem a última estariam na final, e assim foi 2x0 e final garantida. E o outro finalista adivinhem: O time do Marcão.

            Os meninos do time do Murilo tinham uma tática para as mães não lavar os uniformes, cada semana um levava para casa e guardava. Naquele dia quem levou foi Murilo, só que ele esqueceu de guardar devido a euforia da vitória. No outro dia chegou da escola estavam lá todas as camisas no varal, toda sua sorte foi parar na máquina de lavar. E agora?

            Reuniu o time e contou tudo. Todos ficaram desolados, sem suas camisas da sorte como venceriam? Mas manteram a confiança, aquele desempenho não podia ser apenas sorte.

            Começou o jogo e o time do Murilo dominou, mas logo sofreu um gol, depois outro e outro. No fim 4x0 para o time do Marcão.

            Sorte ou não, na dúvida é melhor não lavar a camisa.


PUBLICADO NO JORNAL

FOLHA DE NOVA HARTZ

SEMANAL ANO X EDIÇÃO 360 PÁG. 02

SEXTA-FEIRA 12 DE DEZEMBRO DE 2014

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