Paulo Mendes Campos
Antonio Silva
Sentado na cadeira em frente à porta, parecia contar os
pingos de chuva lá fora, o vidro já embasado não atrapalhava. Certo mesmo é que
estava longe, estava no tempo em que desprezava a velhice, que envelhecer era
apenas uma palavra no dicionário.
Também era bom naquele tempo não ter noção de distância, saber
que o tempo era mais longo, os dias demoravam a passar, mesmo assim
desperdiçavam horas e minutos, eles nunca faltariam, amanha teria igual.
As tardes eram sufocadas pelo calor, o sol e seus raios
lentos castigavam a pele ainda inocente. Mas vivíamos na tentação da bola,
precisávamos nos reunir todas as tardes para vencer as outras faltas. Varávamos
o sol, e nos encontrávamos a noite, tentando provar aos outros que éramos
melhores.
Nem as brigas ou as futuras inimizades poderiam afastar
aqueles meninos magros de cabelos escorridos. Não sabíamos que a terra era
redonda, mas a bola era, a bola era a nossa vida. Ignorávamos a fragilidade do
corpo, nem sabíamos que a vida era muito mais difícil que driblar entre as
pedras soltas da rua. Caíamos com facilidade, mas engolíamos o choro, por
questão de honra.
Quem marcasse o primeiro gol seria um herói, carregava o
sonho de todos. Pode parecer pesado, mas não era. Éramos felizes e a felicidade
também era a maior força. Não tínhamos camisas, os calções eram da cor que
tínhamos, nos encontrávamos na terra pela amizade, o olhar certeiro, o passe
mágico.
Uma única vez ganhamos uniformes, o time da cidade resolveu
trocar, e seu antigo sobrou para nós. Era uma camisa alaranjada com listras
pretas. Eram bem maiores que nós, mas nós éramos grandes ao menos em
pensamento. Ao vestir as camisas ensaiamos passes, dribles e comemorações.
Jogamos um único campeonato, mas tínhamos pouco a mostrar, as
condições (ou a falta delas) não nos deixou passar de um time com um esforçado
zagueiro e com jogadores sem qualquer resquício de habilidade. Seríamos
lembrados pelas minguadas alegrias.
Mas nem tudo foi tão ruim, antes do campeonato uma velha
costureira ajustou os uniformes, mas nós preferiríamos achar que havíamos
crescido. E o mais incrível, foi tirar a foto perfilados, como um time de
verdade.
A foto foi o que restou da infância, na parede, sobrevive ao
tempo. Erámos unidos pelos defeitos, pelas falhas, pelas carências. Não
desejávamos nada a não ser jogar futebol, pertencer a aquele mundo.
O tempo antes longo e ignorado, chegou e levou todos, um para
cada lado, corremos uma vida, mas nunca nos encontramos não recebi mais os
passes, não marquei mais gols. Não se eles continuam ou se se esqueceram de
acreditar. O tempo escraviza, amargura, consome, fomos consumidos pelas
obrigações.
Tudo o que restou foi à
foto na parede. Única lembrança de uma sincera alegria
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