sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

PAPAI NOEL NÃOOO!

Arte: Jean-Léon Gérôme

Antonio Silva

            Jamais me importei com os comentários, brincadeiras ou piadinhas que pudessem vir quando decidi deixar a braba crescer. Não fui obrigado, coagido, pago, não estou seguindo a moda ou algo do tipo, enfim, o fato de deixar a barba crescer foi apenas vontade própria e gosto pessoal.
            A partir disso as piadinhas e comentários vieram, terrorista, ele não tem gilete em casa, ele vai ser engolido pela barba. Sempre levei na brincadeira, até que, aconteceu o episódio de alguém dizer que eu estava me preparando para ser Papai Noel.
            Discordei na hora! Não gostei mesmo! Primeiro porque nunca acreditei no tal do velhinho que te dá presentes no fim do ano, segundo não tenho barriga, terceiro (e principal) jamais em minha vida vou aceitar essa história de bom velhinho blá, blá, blá.
             O tal do Papai Noel é um dos grandes símbolos capitalistas disfarçados por uma crença individualista que alimenta o capitalismo desenfreado. Sempre que me falavam nessa história de Papai Noel, sempre perguntei: - Porque o Papai Noel não dá presente às crianças pobres? – Simples! Os mais pobres são excluídos pelo capitalismo, sendo o Papai Noel um símbolo “amoroso” deste sistema, ele automaticamente exclui os pobres.
            O Papai Noel foi criado simplesmente para aumentar a venda na época de Natal. Mas então porque cobrar bom comportamento e outras coisas em troca de presentes? Simples! A ideia do bom comportamento surge da necessidade de controle social, sendo assim estabelecem-se regras e modelos de comportamentos, se você cumprir essas regras, o controle capitalista é estabelecido, desta forma você recebe um “agradinho” por colaborar indiretamente e inconscientemente com o sistema.
            Desta forma ficamos diante de outro conflito, como comemorar o nascimento do menino Jesus, pobre, humilde, que nasceu numa manjedoura e ao mesmo tempo o Natal do velhinho capitalista que contraria todos os princípios cristãos?
            Sem falar que a comemoração do Natal é em uma data pagã. Os pagãos comemoravam nessa mesma época do Natal, o que eles chamavam de solstício de inverno (o dia mais curto do Hemisfério Norte), após isso os dias começam a ficar mais longos. A celebração ocorria devido ao calendário agrícola, que simbolizava a fertilidade do solo e a manutenção do ciclo da natureza.
            Mais um prova de que o tal do bom velhinho é uma construção capitalista, em alguns shoppings do centro do país você pode encontrar “Papais Noéis fitness” esqueça o velhinho de barba comprida, barrigudo e com roupas compridas e largas. Nesses shoppings você vai encontrar homens malhados, com roupas coladas e barba serrada, ai basta fazer o seu pedido.
            Parece difícil dizer não aos apelos capitalistas, mas podemos sim! Podemos começar fazendo um Natal com menos fantasia e mais humanidade, vamos esquecer a figura mística do Papai Noel, e vamos nós mesmos construir um Natal melhor, e de forma bem simples. Basta ajudar aqueles que estão próximos de nós, às vezes apenas um sorriso e um cumprimento na rua já basta para melhorar a vida de alguém, vai valer muito a pena e não vai custar nada.
            Amor, carinho, gratidão, respeito, solidariedade, paz, honestidade e outros bens imateriais que podemos dar as pessoas são bênçãos divinas que nos foram dadas de forma gratuita e assim também devemos distribui-las.

            Ainda sobre o Papai Noel, depois de falar tudo isso dele, acho que vou ficar sempre presente, afinal não segui as suas regras, ou seja, não fui um bom menino.

sexta-feira, 30 de outubro de 2015

PERDAS



Antonio Silva

Perdemos a humanidade,
Nos tornamos meros,
Objetos de manipulação,
Ideológica maléfica.

Temos que abrir mão de tudo,
Dar tudo ao mesmo tempo.

Mesmo assim seremos pré-julgados
Mortos pela ausência de inteligência,
Que reina em alto e bom som,
Na inteligência imaginativa.

O CELULAR DA MAÇA MORDIDA


Antonio Silva

            Quando decidi comprar um não imaginava o que ele representava. Apenas queria um aparelho que fosse bom, que tivesse uma câmera de alta resolução, boa memória e com uma bateria durável.
            Depois do trauma e do aparelho anterior e do rompimento com aquela marca, resolvi apostar na maçã mordida, queria ver se ele realmente era tudo aquilo que falavam. – E olha era mesmo! – Muitas funções e tudo o resto que eu buscava, porém, descobri o lado ou o posicionamento social que ele representa.
            Para mim ele é apenas um aparelho celular de alta capacidade que atende as minhas necessidades.
Mas para a grande maioria que o possuí ou (o deseja), ele é um objeto de status social, é um objeto de desejo insano para satisfazer a vontade de possuir algo valioso. É uma espécie de passaporte do “poder” o utilizam para classificar os membros do grupo.
É como se aqueles que possuem o celular da maçã mordida fossem os líderes do grupo, são eles que ditam as regras, a moda, o comportamento... Enfim os possuidores dessa maravilha tecnológica, estão moldando a sociedade ao seu redor com valores inúteis.
Quando percebi isso, olhei para mim mesmo, pois diretamente eu possuo um celular da maçã mordida, mas não me encaixo nesses perfis, não sou viciado em internet, não ando na moda, não sigo a maioria das regras desses grupos, não faço praticamente nada do que eles fazem, o que temos em comum (se é que temos algo em comum) é possuir a maravilha tecnológica da maçã mordida.
Ao chegar a essa conclusão, cheguei a pensar ali, que eu finalmente estava construindo algo, talvez ali eu estivesse criando um movimento de “contracultura” em relação à utilização dos aparelhos. Afinal eu não me deixei idiotizar pelas atitudes da maioria, eu não coloquei o “ter” antes do “ser”. Cheguei a pensar também que eu apenas tinha adquirido a tecnologia.
Mas eu preciso ser sincero com quem está lendo e também comigo mesmo. Eu não criei movimento de contracultura ou algo assim, eu não sobrevivi aos anseios da moda, eu não me rejeitei aos grupos. Não aconteceu nada disso, e não é porque eu escrevi isso que irá acontecer.
Eu apenas fui excluído por uma tecnologia que eu sequer ainda terminei de pagar.

domingo, 25 de outubro de 2015

A MESA E A INTERNET

Portinari

Antonio Silva

Há alguns dias atrás, por instantes, me reencontrei com minha infância, vi uma mesa de futebol de botão. Eu nunca tive uma daquelas, nem sequer joguei futebol de botão na minha infância. Mas lembro com carinho e certa saudade de quando eu e mais dois amigos resolvemos montar uma mesa, reunimos papelão e tintas para confecciona-la e nossas economias seriam usadas para comprar os botões. A ideia acabou por não dar certo e esquecemos-nos do assunto.
            Recordei tudo isso ao ver uma mesa em processo de abandono em alguma residência por ai, digo processo, pois ela estava jogada ao relento no fundo da casa, e também porque naquele momento estava sendo instalada na casa uma antena para o sinal da internet.
            Ali tive certeza absoluta que a mesa sairia de campo, que o futebol de botão ficaria para trás, que seria substituído por alguma das maravilhas tecnológicas atuais que contribuem diretamente para o isolamento e o empobrecimento intelectual.
            A mesa seguia ao relento, indiferente ao tempo, ao sol que a castigava, parecia prever o fim próximo, parecia não se importar com mais nada. Sabia que o abandono era certo, que dali em diante sua melhor companhia seria a chuva e o vento.
            Não sei se seu dono ou dona sentiriam saudades, não sei se sentiriam a ausência dos amigos em partidas disputadas, cheias de rivalidade, dos outros amigos ao redor apreensivos na torcida.
            Mas pensando bem o que é uma mesa de madeira, se será substituído por uma máquina potente, maravilhosa, de infinitas possiblidades, que ocupará todo seu tempo, toda a sua vida dali por diante. Uma máquina na qual faltam mãos para mexer tantos botões.
            Aliás, quem sentiria falta de uma mesa que na realidade, quase não servia para nada a não ser trancar canto no quarto. Se livrando da mesa, abre mais espaço, é uma quinquilharia a menos no quarto.
            Já o computador/tablet/notebook, não ocupa espaço, mas sim agrega valor, imagine aquela casa nunca mais será a mesma depois da internet. A partir de agora não haverá mais aquele diálogo cheio de felicidade, não haverá mais entusiasmo na voz, nem nos ouvidos daquelas pessoas, para contar ou ouvir aquelas histórias do futebol de botão. Não haverá mais o gol inesquecível, não haverá mais a virada histórica, não haverá mais interação.
            A partir de agora, cada um ficará em seu mundo particular, preocupado com seu grupo no WhatsApp, com o que as pessoas vão dizer sobre a foto no facebook, o que fazer para ganhar mais e mais seguidores.
            Aquela mesa jogada aos fundos da casa representa muito mais do que o fim do futebol de botão, representa a ruptura de um laço familiar.



PUBLICADO NO JORNAL
FOLHA DE NOVA HARTZ
SEMANAL ANO XI EDIÇÃO N° 386
SEXTA-FEIRA 23 DE OUTUBRO DE 2015

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

COMO GUARDAMOS NOSSOS TESOUROS

Giorgio de Chirico


Antonio Silva

            Como guardamos nossos tesouros? É uma boa pergunta, porém, vai depender do tesouro que tiveres para guardar. Se você tem dinheiro pode muito bem deixa-lo no banco, se você tem um carro basta fazer um seguro, e se você tem uma casa também tem a opção do seguro e uma forma mais prática, cercá-la de grades bem altas, fechaduras nas portas e janelas, câmeras de segurança ou cerca elétrica.
            Mas e seu maior tesouro não for um bem material, não for suas economias, seu carro, sua casa. E se o seu tesouro for apenas algo que você tem que zelar, transmitir valores cuidar para que o futuro não seja apenas um tempo próximo.
            Pois bem, eu estava no ônibus numa importante e movimentada estrada, em meio aos mais diversos tipos de carros ai vamos do velho e bom fusquinha a imponente e potente BMW. Quando passou pelos meus olhos a cena que me questionou “Como guardamos nossos segredos.”
            Caminhava pelo acostamento um homem de camisa, calção, chinelo e boné. A camisa era do Grêmio, de um tempo distinto, quando o clube comemorava façanhas, era velha surrada, tanto quanto o restante de sua roupa. Ele empurrava um carrinho no qual colocava todo o tipo de material reciclado que pudesse vender, que pudesse tirar um dinheiro qualquer para seu sustento.
            Aquele homem guiava aquele carrinho com cuidado, e sua expressão era de felicidade, era uma felicidade mais radiante até mesmo do que a felicidade de um torcedor que tinha visto seu time conquistar uma vitória importante. Era uma felicidade cuidadora, orgulhosa. Naquele olhar de atenção era possível perceber a sua realização pessoal, era possível perceber a nítida alegria de alguém que carregava ali o bem mais precioso de sua vida.
            Mesmo entre o intenso movimento de carros, era possível perceber a total atenção dele dentro daquele carrinho que até então só servia para carregar o que consideramos lixo.
            Dentro do carrinho havia uma criança, que deveria ter no máximo dois ou três anos. Aquela criança deveria ser seu filho, o qual ele carregava com toda atenção e carinho dentro de suas condições.
            A criança assim como o homem parecia estar feliz, apoiada no carrinho estava em pé, se divertindo com o movimento, com o barulho ao seu redor. Tudo era engraçado, desde o fusquinha até a BMW, nada tinha valor material. Tudo era uma questão de valor afetivo, alegria, diversão, liberdade. Para aquela criança, não importava se em outros momentos o mesmo carrinho que ela andava carregava lixo. Para ela importava a felicidade de experimentar, o que nós chamamos de liberdade, mas com um adicional a inocência. Quando se é inocente, tudo se torna mais fácil.
Na inocência somos sinceros, não tememos as palavras.
Na inocência somos felizes, os gestos ocorrem com naturalidade.
Na inocência amamos com toda a intensidade.
Na inocência somos intensidade pura, pois não há medo, não há repressão, não há regra.
Na inocência somos felizes sem conhecer o peso da palavra.
Aquela criança dentro de um carrinho de “lixo” era o maior tesouro de quem o transportava. Fazia com zelo, com atenção, com dedicação. Para aquela criança quem o transportava era seu maior tesouro por em um gesto simples fazer com que ele experimenta-se tantas sensações que serão fundamentais em seu desenvolvimento.
            Somos o maior tesouro de quem nos ama, e por vezes não percebemos que teríamos que fazer de quem nos ama nosso maior tesouro. Às vezes nos deixamos endurecer pela rotina, pelo excesso de afazeres, pelo pouco tempo de convivência. E esquecemos que o nosso maior tesouro está ao nosso lado dentro de nossa casa.

            Então como guardamos nossos tesouros?