Após a morte da Preta Gil, as redes sociais foram inundadas de posts, frases e lembranças. Naturalmente, para quem a conhecia. Uma oportunidade para quem surfa na onda do momento, independente do tema.
Eu, particularmente, não a conhecia, não acompanhava seu trabalho, mas soube de sua vivência com a doença e de sua coragem em falar abertamente sobre ela e expor suas cicatrizes.
E, por falar em cicatrizes, uma frase me chamou atenção: "Eu não tenho vergonha das minhas cicatrizes". Ela, em especial, além de ser um relato potente sobre levar a vida da forma como ela se apresenta, me fez lembrar de mim e de tantas outras pessoas que, assim como eu, convivem com uma deficiência.
"Eu não tenho vergonha das minhas cicatrizes"
Ser uma pessoa com deficiência naturalmente vai nos trazer cicatrizes. Muitas delas são físicas, seja por cirurgias ou tratamentos que buscam nos "curar", visto que ainda estamos presos ao modelo biomédico e à necessidade de "consertar" as pessoas. Porém, não somente o nosso físico é afetado; muitas das cicatrizes são emocionais, sociais, financeiras e sexuais. Ou seja, além do físico, precisamos lidar com diversas outras cicatrizes causadas por uma sociedade que nos rejeita, nos relega ao lugar do esquecimento, do abandono.
O capacitismo, ainda tão pouco conhecido, falado e explorado, já nos exclui desde antes de nascermos, já nos deixa cicatrizes que vamos carregar ao longo da nossa trajetória.
Mas onde entra a Preta Gil nisso? Na potência da sua frase: "Eu não tenho vergonha das minhas cicatrizes". Ao não termos vergonha de nós mesmos, vencemos o medo. Ao não termos vergonha de nossa história, criamos potência. Ao não termos vergonha das nossas cicatrizes, nos amamos mais. Ao não termos vergonha da nossa luta, vencemos qualquer batalha.
Devemos nos orgulhar de nossas cicatrizes; elas são o mapa da nossa vida. E, quando sentimos orgulho, damos um basta no capacitismo.